Este artigo é uma crítica à cultura tóxica do “positivismo obrigatório”. Nem todos os dias estamos bem, e tá tudo bem!
Você já acordou com aquela sensação de que hoje seria o dia perfeito para ser produtivo, comer salada, meditar, responder todas as mensagens atrasadas, ir para a academia e treinar como um Sith em dia de ódio… e aí, às 10 da manhã, lá estava você novamente no sofá vendo memes de gato?
Pois é. Vivemos em um mundo que transformou amor-próprio em uma simples checklist: se você não está evoluindo 24/7, parece que está fazendo algo errado. Mas aqui vai um spoiler: isso é balela. E, surpresa, a ciência concorda.
O mito da “melhor versão” (e por que ele é um péssimo personal trainer emocional)
Em 2019, um estudo publicado no Journal of Personality and Social Psychology descobriu que pessoas que se cobram demais para serem “positivas o tempo todo” acabam com mais estresse e menos resiliência. Sim, aquele discurso de “basta querer!” Pode, ironicamente, te deixar mais frustrada.Pense em um exemplo. Todos temos aquela amiga ou colega de trabalho que sempre fala “sorria!” Quando você claramente quer jogar o café na cara dela. Esse tipo de comportamento, ainda que inconsciente (na maioria das vezes, as pessoas querem apenas ajudar), não ajuda em nada. Na verdade, o resultado é exatamente o contrário: ele cria culpa. Porque, convenhamos, ninguém é uma máquina de vibes altas – a não. ser que você seja um robô programado para ser positivo e sorridente o tempo todo. E isso (ainda) não existe, eu acho.
A tirania por trás do “good vibes only”.
A psicóloga Julie Norem cunhou o termo “pensamento defensivamente pessimista”: em vez de se forçar a acreditar que tudo vai dar certo, algumas pessoas lidam melhor aceitando que às vezes tudo pode dar errado. E tá tudo bem!
Quando transformamos a autoaceitação em mais uma meta (“Tenho que me amar! Tenho que ser grato! Isso vira só outra forma de se punir. É como se o universo dissesse: “Parabéns, você falhou em estar feliz. Tome aqui seu troféu de decepção. Coloque na prateleira junto com os outros troféus de decepção que já te dei essa semana!”
Permissão para ser humano (e não um meme de motivação).
Aqui vai um exercício radical: odeie seu dia às vezes.
Não estou dizendo para afundar no sofá com um pote de sorvete eternamente (embora, em doses homeopáticas, isso seja terapia). Mas sim que crescimento não é linear. Nunca foi e nunca será.
Pense o seguinte: se hoje você só conseguiu levantar e escovar os dentes (ou nem isso), já está ótimo. O resto é lucro.
E se “amor-próprio” for só… não se odiar?
No fim, talvez a melhor versão de você seja justamente a que não se culpa por ter dias ruins. Até porque, como bem lembrou a escritora Anne Lamott: “Minha mente é um bairro perigoso.” Não devo entrar lá sozinha.”
Portanto, não se sinta mal se hoje você não é um poço de good vibes. Às vezes a vida nos dá rasteiras, às vezes acordamos de TPM e odiamos tudo e todos, às vezes perdemos algo ou alguém importantes e precisamos passar por esses sentimentos ruins.
Uma dica? Sinta. Chore. Afunde-se no sofá com um pote de sorvete e assista O Diário de Bridget Jones. E o mais importante: não se julgue.
Fique bem.
Fontes para as estudiosas: Journal of Personality and Social Psychology, 2019; Julie Norem, “The Positive Power of Negative Thinking”.